Mentiras na Internet podem ser fatais

Áviner Rocha Santos, Dario José Kist e Moacir Silva do Nascimento Júnior

Usuário de rede social iniciou interação atraído pela beleza da mulher que aparecia na imagem de perfil. Começaram a conversar pelo canal privado e logo surgiu aquela mesma mulher despida em videochamada, dançando de forma sensual. Ela escreveu, com vários erros gramaticais e sintáticos, que não podia falar porque o microfone do seu notebook estava com defeito. Dançou de novo e pediu para que o usuário fizesse o mesmo. Ele foi além. Praticou atos sexuais que foram transmitidos em vídeo e áudio para criminoso residente em país do continente africano, que passou a chantagear o usuário brasileiro a partir disso.

Essa não é uma narrativa ficcional e histórias similares ocorrem todos os dias. Criminosos conseguem manipular ferramentas tecnológicas para causar uma falsa sensação de segurança e obter proveitos de toda ordem. Muitos não estão interessados em qualquer recompensa financeira. Há pessoas muito perigosas navegando pela Internet interessadas em estimular suicídios, inclusive de crianças, interromper serviços de relevância pública, espalhar o terror ou causar qualquer espécie de mal aos seus semelhantes.

O usuário da história narrada foi constrangido a depositar milhares de reais em criptomoedas, em curto espaço de tempo, sob pena de divulgação do vídeo íntimo. Após constatar que ele não detinha recursos financeiros para realizar o depósito, o criminoso enviou o vídeo para amigos e familiares da vítima e postou a mídia no Youtube com título que informava se tratar de um pedófilo que se excitara ao visualizar cenas de pedofilia.

Em julho do ano passado, o jornal The New York Times noticiou assassinatos e espancamentos realizados por multidões influenciadas por acusações falsas, viralizadas no WhatsApp, contra supostos sequestradores de crianças. Uma mulher inocente de sessenta e cinco anos foi brutalmente assassinada e seus familiares gravemente feridos. Após isso, o aplicativo sofreu atualização naquele país para limitar a cinco o número máximo de encaminhamentos simultâneos, medida posteriormente adotado também no Brasil.

A livre circulação de ideais é uma das principais bases da democracia, mas o exercício da cidadania impõe constante reflexão sobre as consequências dos atos de comunicação. Quem encaminha mídias, notícias sensacionalistas e mensagens ofensivas ou acusatórias contra outras pessoas, além praticar, em tese, crime contra a honra, pode estar contribuindo para movimentos de massa potencializados pela eficiência das novas tecnologias.

Essa é uma questão muito séria e todo usuário da Internet pode e deve contribuir para que mentiras não se transformem em mortes e sofrimento de inocentes. Buscar fontes confiáveis de informação, não replicar vídeos ofensivos ou grotescos, mesmo que se busque com isso alertar possíveis vítimas, ter cautela no compartilhamento de conteúdo aparentemente jornalístico, portanto, são posturas que se tornam cada vez mais importantes para os usuários da Internet.

Áviner Rocha Santos, Dario José Kist e Moacir Silva do Nascimento Júnior são promotores de justiça e membros do Núcleo de Crimes Cibernéticos do Ministério Público do Estado da Bahia.

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